21 de março de 2013

DIA MUNDIAL DA POESIA

O QUE RESTA PARA COMER?
Nas noites de outrora ouvi histórias de fome, de muita privação, onde uma sardinha era repartida por três, e a mesa havia um pouco de nada para comer. Histórias de vida de famílias numerosas onde as mesas não eram fartas, e tudo servia para enganar o estômago. Pensávamos que esse tempo não voltava, mas infelizmente as histórias que ouvimos não são muito diferentes, embora, hoje as famílias não sejam tão numerosas, mas a tristeza, a míngua grassa por tudo o lado.
Hoje, no dia mundial da poesia, lembrar um poema de Pier Paolo Pasolini que de forma profética relata este tempo.


A RECESSÃO

Reveremos calças com remendos
vermelhos pores do sol sobre as aldeias
vazias de carros
cheias de pobre gente que terá voltado de Turim ou da Alemanha
Os velhos serão donos de suas muretas como poltronas de senadores
e as crianças saberão que a sopa é pouca e o que significa um pedaço de pão
E a noite será mais negra que o fim do mundo e de noite ouviremos os grilos ou os trovões
e talvez algum jovem entre aqueles poucos que voltaram ao ninho tirará pra fora um bandolim
O ar terá o sabor de trapos molhados
tudo estará longe
trens e ônibus passarão de vez em quando como num sonho
E cidades grandes como mundos estarão cheias de gente que vai a pé
com as roupas cinzas
e dentro dos olhos uma pergunta que não é de dinheiro mas é só de amor
somente de amor
As pequenas fábricas no mais belo de um prado verde
na curva de um rio
no coração de um velho bosque de carvalhos
desabarão um pouco por noite
Mureta por mureta
Teto em chapa por teto em chapa
E as antigas construções
serão como montanhas de pedra
sós e fechadas como eram uma vez
E a noite será mais negra que o fim do mundo
e de noite ouviremos os grilos e os trovões
O ar terá o sabor de trapos molhados
tudo estará longe
trens e ônibus passarão
de vez em quando como num sonho
E os bandidos terão a face de uma vez
Com os cabelos curtos no pescoço
e os olhos de suas mães cheios do negro das noites de lua
e estarão armados só de uma faca
O tamanco do cavalo tocará a terra leve como uma borboleta
e lembrará aquilo que foi o silêncio o mundo
e aquilo que será.

PIER PAOLO PASOLINI
Tradução: Mario S. Mieli



Nenhum comentário:

-------------------------------Um baú de histórias e memórias--------------------------------