Somos um povo de saudades, umas, dos cheiros, outras dos sons e daquelas saudades que tenho do tempo de meninice é do despertar do galo. Não é que ele cantasse nos momentos adequados, mas o mundo quando ele cantava como que sofria uma moratória, e tornava-se por momentos campestre, de horas sem horas, dadas pelos galináceos, ou então do sino na torre altaneira da Igreja.
Era todo um bulício que aos poucos, ganhava vida, na rua ouvia-se a passagem dos carros de bois, porque, em frente da casa dos meus pais, o alcatrão tinha pintado a paisagem, sempre era uma estrada nacional. Esses conjuntos de ruídos, que no seu todo nos transmitia a sensações de estarmos num mundo diferente, não aquele mundo da cidade, porque viver em Besteiros sempre senti que vivia na aldeia. Conhecia-se os ruídos, sabíamos quem eram as pessoas, os que andavam pela madrugada, desde o padeiro, ou dos trabalhadores à jorna, ou mesmo os operários que iam para as fábricas. Os animais, sedentos de comida davam sinais impacientes para terem os seus estômagos saciados e nisso eram impiedosos, a paciência da espera não se coadunava com eles. À noite, sempre foi a noite, para uns, um as “noites” era de descanso, por isso os raiares do dia já os apanhava fora da cama, ocupados com as suas tarefas diárias. Tarefas rotineiras, mas úteis, necessárias ao dia a dia, porque, sempre se ouvia, de manhã, começa o dia. As casas não eram de cidades, muitas delas com as divisões em tabique, as melhores feitas de pedras, mas essas eram de agricultores ricos. Ainda hoje quando se olha para essas casas, a porta maior, muitas vezes chamada de porteira, por onde entravam os carros dos animais que transportavam os produtos agrícolas. Se nos dermos a esse exercício de estar atento, de olharmos, ainda vemos nas nossas aldeias essas marcas na paisagem, os tamanhos diferentes das portas, as dos agricultores, os arremediados, outras, mais pequenas, daqueles que sobreviviam.
Joaquim Calheiros
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