19 de abril de 2012

MEMÓRIAS DA ESCOLA PRIMÁRIA


Memórias guardadas do tempo da primária, onde na escola primária de Campo de Besteiros brincava-se sem preocupações, mesmo num país que ainda não tinha desfrutado da aurora da liberdade. Um muro, não como o muro de Berlim separava o recreio dos rapazes do recreio das raparigas. As turmas eram mistas, mas na hora do recreio cada grupo ocupava o seu espaço. Nada de misturas, porque a moral e os bons costumes assim o exigiam.
No espaço reservado aos rapazes brincava-se aos cobóis e os índios aproveitando os arbustos para nos escondermos dos nossos inimigos. Outras vezes, quando as professoras deixavam, disputavam-se partidas de futebol como autênticos derbies nacionais que escutávamos na rádio, nas tardes de domingo entre o Sporting e o Benfica. Hoje, a televisão, as diferentes horas dos jogos retirou aquela magia dos relatos, aquela magia dos quase golos transformados em bola fora. Rasgavam-se os joelhos, nas pedras e areias do recreio, sujavam-se os calções, esmurravam-se os sapatos, porque isso de sapatilha era coisa de menino rico. Mais tarde de bata vestida, todos ficavam iguais preparados para lição e sempre com temor da menina-de-cinco-olhos. O WC, ou casa de banho, ou então em termos bem portugueses a retrete ou então a latrina era a famosa aquela de buraco no chão, que vendo bem as coisas não criava grandes problemas de higiene.
De tarde regressava-se a casa como um autênticos bandos de pardalitos, mas sem antes de se correr à pedrada os da Ladeira. Autêntica intifada e vá lá compreender-se porquê. De dia amigos, de tarde separavam-se as águas e os territórios.
Crescia-se feliz, tinha-se a rua como segundo lar, onde se jogava a bola, ao botão, ao ferro, ao pião. Rasgavam-se os joelhos, lavava-se com água, mas logo a seguir estava-se pronto para outra, porque a brincadeira não esperava. Por vezes partia-se um vidro, e então ficava-se sem a bola, e aí nada nos livrava do castigo. Não ficávamos traumatizados, nem a precisar de acompanhamento psicológico. Enfim, outros tempos.
Nas caminhadas comiam-se amoras, que manjar dos deuses que nos nossos dias são frutos silvestres de compotas e de pratos de requinte. Nos pinhais apanhavam-se os pinhões, e nos pomares não se desperdiçava as laranjas, ou as tangerinas.
O tempo corria de devagar, mesmo muito devagar. O mundo estava mais distante, no horizonte tinha-se a guerra colonial. Outros tempos, velhos tempos.
Brevemente chegará o centro escolar, novas instalações, nos terrenos da Escola Básica de Campo de Besteiros. Podemos dizer, nos terrenos onde deveria ter sido construída a Escola Secundária.

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