Escrevi este texto, faz anos, anos que vão
passando de forma inexorável, por nós e pela nossa terra, o nosso vale de
Besteiros, a nossa “bela adormecida”, por vezes muito adormecida, em alguns
sítios alindada, mas sem vida.
“Todos os dias, mesmo, todos os dias,
trezentos e sessenta cinco dias no ano, penso no meu torrão natal, na “bela
adormecida” e na minha serra, o Caramulo. Todos os dias, a memória enche-se
imagens de tempos idos, que não voltam em que calcorreava os caminhos, as
veredas, em que inspirava o ar puro deste cantinho único que é o vale de
Besteiros. Ser de Besteiros fiquem cientes é ser diferente, mesmo, somos
diferentes, mas orgulhamo-nos disso, ser diferentes. Aqui não importa ter
bebido água na Fonte do Bico, ou na da Póvoa, muito menos na do Calvário,
diziam alguns, a melhor, aqui interessa ser devoto de Nossa Senhora do Campo,
sim, acreditamos na Nossa Senhora do Campo que nos protege. Para os mais jovens
nunca souberam, ou, irão saber, o prazer de mergulhar na Pedra Furada, ou
mesmo, na Tabuaça. Os nossos dias eram regidos pelo toque do sino da Igreja
Matriz e das sirenes das fábricas, a Velha e a Nova.
Na hora de despegarem do trabalho eram um
enxame de gente, a pé ou de bicicleta, a avenida Afonso Costa enchia-se como
por magia da vozearia dos operários besteirenses.
Campo de Besteiros, ou a antiga Santa
Eulália de Besteiros não tem certidão de nascimento, embora Campo de Besteiros
assuma o nome por direito, a partir de 4 de fevereiro de 1929, quando lhe é
atribuído o título honorífico de vila e, a alteração do nome. Poderá afirmar-se
que se escreveu no papel, o que há muitos anos era considerado, de a antiga
freguesia de Santa Eulália designar-se por Besteiros ou Campo de Besteiros. Era
assim como era conhecida até mais Besteiros do que Campo de Besteiros. Era
assim que se escrevia nos jornais da época. Desse tempo temos histórias,
algumas histórias interessantes, histórias de um grande empreendedorismo local,
apesar, de nesse tempo, essa palavra não fizesse parte do vocabulário. Apelidar-se-ia
de bairrismo, mas era um bairrismo arrojado, criativo que ousava combater já um
certo centralismo concelhio.
Partir para o mundo, deixando para trás a
terra natal, onde demos os primeiros passos, balbuciámos as primeiras palavras,
cria em nós, um sentimento de perda de algo que muitas vezes não sabemos
exprimir. Aquelas pequenas coisas a que não dávamos valor, aquelas paisagens
que para nós eram banais, por serem repetitivas, começam a transformar-se em
pequenas maravilhas, motivadas pela ausência prolongada e a consequente
distância. Dá-se valor ao cheiro da terra, quando voltamos por algumas horas,
ou àquele perfume inebriante quando o vale está florido, ou mesmo àquela aragem
quente que nos conforta, à proteção da serra a um vale encantado que nos faz
sentir quando regressamos, nem que por breves momentos, que nos dá a sensação
de chegámos finalmente a casa”.
Hoje e sempre Campo de Besteiros, a minha
terra, o meu mundo!
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