Que prazer se tem em
ouvir o som da água a cair, aquela leveza. Os círculos que constrói ao embater
na outra água que não deixa parar, porque constantemente jorra por uma torneira
farta. São aqueles prazeres que se tem, quando o tempo ainda tem tempo para se
olhar. Aqui não falamos se é água controlada, ou não controlada, embora
gostasse de saber quando foi a última vez que foi controlada e o resultado da
mesma. Acho estranho que não se queira saber, se “podemos beber em todas as
fontes” ou não, ou então saber as razões. O nosso vale é rico em fontes, cada
uma com a sua história que marcam a paisagem e narram histórias dos lugares que
servem. Hoje, porém, não é a história das fontes, que muitas vezes serviam para
um despertar com um lavar de “cara à gato”.
Mas digam se não é
prazenteiro acordar ao som da água a cair, de forma mansa, levemente, somente
ouvir. Não era só resultante de sons, o despertar, também de cheiros e alguns
odores especiais que os atraía para a mesa, sentadinhos a tomar o pequeno-almoço,
coisa chique de cidade, ó coisa de ricos, porque pobre não se dava a esses
luxos. O cheirinho a café, fica bem aqui, escrever a café, porque aquilo era
cevada, cevada feita em pote, mas que sabia divinamente.
Procura-se, hoje, como se
procura uma quimera esses odores aldeãos, uns, porque conservam em si
lembranças de outros tempos, outros, porque querem vivenciar experiências de
antanho, como se por magia o tempo parasse e tudo voltasse ao que era dantes do
qual se escreve “parece que eramos felizes, mas só que não sabíamos”. Gosto
deste termo vivenciar experiências, alguns ganham dinheiro com isso e fazem
bem, porque vivenciar é um termo a modos que, torna a coisa cara, coisa chique,
pois então. Olha-se para esses promotores, sobretudo para os nomes de família e
não têm idade para alguma vez terem vivenciado essas experiências, ou estatuto
social, porque aquilo que se pretende proporcionar era coisa de pobre, que o
remedeio e as regras de sobrevivência obrigavam.
Experienciar forte seria
o odor à aguardente, o cheirinho dos figos, ou seja, um vivenciar do povo, do
jornaleiro que ia ganhando o dia. Aquele odor matinal, remédio infalível,
segundo alguns para o matar o bicho, aquele bicho do estômago, responsável
pelos roncos notívagos, ou as dores que não deixavam descansar o comum dos
mortais. Era de homem e mulher talhados
pela dureza do campo tomar pela manhã o “mata-bicho”, coisa frugal, normalmente
encostada a banca, tosca por sinal, ou à ombreira da porta, enquanto se deitava
o olho ao gado de bico, que debicava tudo que lhe aparecia pela frente. Do
mata-bicho, a tradicional imagem é de uns figos secos e um cálice de aguardente,
mas seria também, a imagem do pequeno-almoço camponês frugal, porque não havia
tempo para mordomias e nem fartura conjugava com o recheio do casebre.
Não será essa a
experiência vivenciada, nem a dormida proporcionada foi na enxerga em que o
corpo descansava após um dia de trabalho. Sempre marcado pelo toque do sino. Vi
muitas vezes o tomar do “mata-bicho”, ouvi histórias de miséria e pobreza que
alguns gostavam de narrar, como, apesar de tudo, a vida era diferente.
Joaquim Calheiros
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