5 de maio de 2016

FESTA DAS CRUZES

APESAR DA CHUVA REVIVEU-SE A TRADIÇÃO!



Chovia que Deus a dava. Mas este ano do céu tem vindo uma grande fartura de água, os campos estão húmidos e e tanta água também não é benéfica! Mesmo com chuva, mesmo por vezes olhar para o chão e desviar das poças, foram ainda muitos resistentes que subiram a serra para participar na Festa das Cruzes.
Reviver e participar na Festa das Cruzes no Guardão é daqueles momentos mágicos que num momento nos transporta ao nosso tempo de infância, em que o dia de Ascensão era de importância transcendente, na religiosidade do vale e da serra. Os nossos antepassados transmitiam aos mais novos a vontade de continuar até ao fim dos tempos esta tradição, a vontade de um povo, que nos anos quarenta do século XX, mesmo sem serem acompanhados por um padre continuaram a cumprir a tradição. Mesmo ameaçados de excomunhão foram ano após anos cumprir a palavra daqueles que honraram este povo de Besteiros.   As origens apontam datas, mas a tradição oral que foi sendo transmitida de geração em geração deveu-se às lutas contra os mouros, e os povos do vale, aguerridos foram em auxílio das gentes da serra, situação que parece recreada na formação das procissões de Santiago de Besteiros, Campo de Besteiros e Castelões.
 Perto de um antigo castro, as três freguesias, em posições diferentes como num campo de batalha se tratasse preparam-se para percorrer caminhos impregnados de história, ao mesmo tempo que se apuram as vozes para, neste caso não dar gritos de guerra, mas para entoar as ladainhas a louvar e rogar pelas sementeiras que entretanto nos aguardava outrora num vale fértil. De histórias e de lendas conta-se que chefe Lusitano Briceu recrutou nestas terras os seus valorosos guerreiros, que se notabilizaram no domínio da Besta, dando origem ao nome Besteiros que se estendeu a toda uma terra. A tradição oral perpetua esta versão, onde muitas vezes a Igreja via-se abraços com o culto pagão às divindades que entretanto procurou cristianizar. Certo que esta festa não remonta ao tempo das lutas entre cristãos e mouros, sendo muito mais recente, mas nada contraria que não seja recreada essa luta de importância transcendental para o povo cristão. Aconteceu noutros sítios, onde grandeza dos acontecimentos que ficaram na memória popular fossem mais tarde honrados por povos vindouros. De certeza que existe uma grande ligação entre o culto de Nossa Senhora do Campo onde se deslocavam as quatro freguesias em momentos diferentes do ano, com as festas das cruzes e sobretudo a cerimónia de bênção dos campos. Era à Nossa Senhora do Campo aquém recorriam os agricultores para a proteção das suas sementeiras. As três freguesias do vale de Besteiros continuam com as suas procissões a participar na Festa das Cruzes, mas ao Santuário de Nossa Senhora do Campo somente cumpre a tradição a paróquia do Guardão, que no dia de São Lourenço desce ao vale e vem honrar a promessa dos seus antepassados.
Em dia de chuva, em dia de nevoeiro, sem se poder ver o vale, a Festa das Cruzes ainda encanta, já sem as grandes multidões de outrora, porque os tempos são outros, menos dados à satisfação do espírito e à religiosidade. São momentos únicos, participar, sentir, ouvir, ver o desmanchar a procissão para mais à frente, junto à Capela de São Sebastião se formar novamente, então em direção à Igreja Matriz do Guardão onde serão recebidas pelos anfitriães, não para travarem uma batalha, mas para darem o abraço de paz, de solidariedade, e que momento este, tão profundo, tão significativo.
Por último depois da Eucaristia e da cerimónia da bênção dos campos, aqui alguma semelhança com a Festa da Espiga que ainda acontece por esse país fora, as quatro freguesias vão em majestosa procissão percorrer os caminhos, que antes tinham sido percorridos individualmente por cada uma das freguesias participantes.
Festa das Cruzes do século XXI, ainda continua ser mágica, ainda transporta consigo a mensagem da importância da história comum do vale com a serra. Reviver impõe-se e não importa a sua origem, importa sim a sua mensagem, embora hoje as coisas parecem feitas sem o sentir, onde as procissões a decorrer rodeada por bancas, onde ao mesmo tempo se enchem copos de vinho e se negoceia umas tortas ou umas ferramentas para o campo.  

Quanto à história nada prova aquela teoria das doze paróquias, antes pelo contrário, mas nesta comemoração revive-se um momento bastante significativo na vida destas quatro paróquias, e uma profunda ligação com o culto de Nossa Senhora do Campo. 

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