Reviver e participar na Festa das Cruzes no Guardão é daqueles momentos
mágicos que num momento nos transporta ao nosso tempo de infância, em que o dia
de Ascensão era de importância transcendente na religiosidade do vale e da
serra. As origens apontam datas, mas a tradição oral que foi sendo transmitida
em geração e geração deveu-se às lutas contra os mouros, e os povos do vale,
aguerridos foram em auxílio das gentes da serra, situação que parece recreada
na formação das procissões de Santiago de Besteiros, Campo de Besteiros e
Castelões.
Perto de um antigo castro, as três
freguesias, em posições diferentes como num campo de batalha se tratasse
preparam-se para percorrer caminhos impregnados de história, ao mesmo tempo que
se apuram as vozes para, neste caso não dar gritos de guerra, mas para entoar
as ladainhas a louvar e rogar pelas sementeiras que entretanto nos aguardava
outrora num vale fértil. De histórias e de lendas conta-se que chefe Lusitano
Briceu recrutou nestas terras os seus valorosos guerreiros, que se
notabilizaram no domínio da Besta, dando origem ao nome Besteiros que se
estendeu a toda uma terra. A tradição oral perpetua esta versão, onde muitas
vezes a Igreja via-se abraços com o culto pagão às divindades que entretanto
procurou cristianizar. Certo que esta festa não remonta ao tempo das lutas
entre cristãos e mouros, sendo muito mais recente, mas nada contraria que não
seja recreada essa luta de importância transcendental para o povo cristão. Aconteceu
noutros sítios, onde grandeza dos acontecimentos que ficaram na memória popular
fossem mais tarde honrados por povos vindouros. De certeza existe uma grande ligação
entre o culto de Nossa Senhora do Campo onde se deslocavam as quatro freguesias
em momentos diferentes do ano, mas todas as procissões ocorriam após a Festa
das Cruzes, mantendo-se hoje somente a tradição da paróquia do Guardão de no
dia de São Lourenço descer ao vale e honrar a promessa dos seus antepassados.
Mesmo de dia de céu um pouco encoberto, mas de vez em quando o sol espreitava, a
Festa das Cruzes ainda encanta, já sem as grandes multidões de outrora, porque
os tempos são outros, menos dados à satisfação do espírito e à religiosidade.
São momentos únicos, participar, sentir, ouvir, desmanchar a procissão para
mais à frente, junto à Capela de São Sebastião se formar novamente, então em
direção à Igreja Matriz do Guardão onde serão recebidas pelos anfitriães, não
para travarem uma batalha, mas para darem o abraço de paz, de solidariedade, e
que momento este, tão profundo, tão significativo.
Por último depois da Eucaristia e da bênção dos campos, aqui alguma
semelhança com a Festa da Espiga que se distribui por esse país fora,
triunfantes as quatro freguesias vão em majestosa procissão percorrer os
caminhos, que antes tinham sido percorridos individualmente.
Festa das Cruzes do século XXI, ainda continua ser mágica, ainda transporta consigo a mensagem da importância da história comum do vale com a serra. Reviver impõe-se e não importa a sua origem, importa sim a sua mensagem, embora hoje as coisas parecem feitas sem o sentir, onde as procissões a decorrer rodeada por bancas, onde ao mesmo tempo se enchem copos de vinho e se negoceia umas tortas ou umas ferramentas para o campo.
Quanto à história nada prova aquela teoria das doze paróquias, antes pelo contrário,
mas nesta comemoração revive-se um momento bastante significativo na vida
destas quatro paróquias, onde de certeza entra o culto de Nossa Senhora do
Campo.
2 comentários:
Parabéns pelo blog e pelo que tem publicado em especial por este, dia da festa das cruzes.. há tradições e história que nunca deveriam ser perdidas por todos os significados quer sejam religiosos ou não.
Mais uma vez parabéns pelo trabalho!
Deolinda Santinha
Obrigado por estas palavras e sobretudo obrigado por perderem algum do vosso tempo em visitá-lo.
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